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Cap 123 - Os sonhos de Nina

Alguns dias depois...

Diego está ajoelhado em frente a cama de Nina enquanto ela espera ele amarrar os cadarços de seu tênis. A menina brinca com o colar em seu pescoço. Alice a convenceu de deixar o pequeno anel ali para que não o perdesse.
"Lembra-se do que prometeu?"
"Aham..."
"Então repita para o papai."
Nina coloca o dedinho no queixo e olha para cima tentando relembrar.
"Hum... Nada de subir nas camas dos velhinhos do hospital?"
"E mais o quê?"
"Não sair pra pra comer gelatina com as enfermeiras?"
"Isso mesmo. Se não eu vou ter que te colocar na coleira que nem fazemos com os cachorrinhos fujões... Toda hora você desaparece."
"Então não devo fazer as coisas que o dindinho manda?"
"O Tomás?" Diego se levanta e Nina ergue os braços para que ele a pegue no colo. Quando saem do quarto e descem as escadas, ela explica:
"Ele manda eu ir brincar com as enfermeiras, depois aparece pra me buscar, mas fica o maior tempão falando com elas... Ele disse que eu sou irmã da gata, papai."
"É o quê?" Diego subitamente entende e começa a rir. "Ah, um ÍMÃ de gata."
"É! O que é isso, papai?"
Diego confere as portas antes de sair de casa e abrir o carro para colocar Nina na cadeirinha.
"Quer dizer, filhinha, que seu padrinho vai levar bronca hoje."



***

No hospital as coisas não poderiam estar mais loucas. É muita gente correndo de um lado e outro, Leonardo sempre com o celular no ouvido, os amigos falando loucamente e Eva grudada em Roberta, falando sem parar.
"Ai, eu queria ter ficado com você quando tudo aconteceu, filha, me sinto péssima!" Eva ajuda Roberta a ajeitar sua mala para retornar ao lar. Ela ainda está um pouco lenta para caminhar, mas se sente muito mais empolgada desde que recebeu alta. Não aguentava mais ficar presa naquele lugar.
"Não se preocupe, mãezinha, eu sei que estaria aqui se pudesse." Ela para por um instante e abraça Eva, sabe que é a única forma de ela se acalmar. "Eu estou muito bem agora, já passou, ok!"
"Me diz uma coisa... como vai ser o casamento?" A cantora dá um olhar cúmplice a animado em direção à filha. "Já pensaram nisso? Precisam de ajuda para conseguir um lugar? Eu tenho muitos contatos."
"Não se preocupe, nós já sabemos como vai ser."
"Ah, é? Me conta, por favor, eu prometo manter segredo!"
"Eu também vou manter segredo."
"Ah, não, da sua própria mãe?" Eva bate o pé igual criança.
"Brincadeira, quando a gente chegar em casa te explico tudo."
Roberta ajeita os cabelos diante de um pequeno espelho. Está um pouco bagunçado, o que parece bem com o normal. Joga os cachos louros para trás e coloca uma cor nos lábios com o único batom que conseguiu que lhe trouxessem. Sabe que Alice lhe traria até um maquiador profissional se pedisse, mas se contentou com o pequeno estojo de maquiagem que Carla lhe ofereceu. É mais do que suficiente parecer saudável outra vez. Não quer que Diego e Nina se preocupem ao vê-la pálida e abatida. Precisa parecer bem e disposta como sempre.
"Então, dona Eva." Ela se vira animada para a mãe. "Como estou? Cadê todo mundo? Estou louca pra voltar pra casa!"
"Ah, você está linda e todos estão lá fora te esperando... Quer dizer, o Diego ainda não chegou."
"Deve estar que nem louco tentando vestir a Nina." Roberta se diverte ao imaginar a filha correndo depois do banho e se escondendo no guarda-roupas, dando aquelas risadinhas sapecas. Ela sempre faz isso.
De repente alguém aparece na porta e o sorriso delas diminui. Leonardo sempre está sério demais, mas dessa vez ele tenta sorrir de um jeito desengonçado, como se não soubesse muito ser simpático.
"Vim ver como está... Precisa de alguma coisa?"
"Não, não..." Roberta o encara com carinho. "Mas quero agradecer por tudo que fez. O Diego me contou que você cuidou de nós, da imprensa e protegeu a Nina de todas as notícias... Obrigada."
Ele fica um pouco desconcertado e feliz ao mesmo tempo.
"Vocês são minha família... E é isso que faço pela minha família."
Quando o telefone toca e ele olha a mensagem, dá um grande sorriso.
"Bem, a Silvia finalmente conseguiu voltar para casa e está no aeroporto com os meninos."
"Pelo jeito todo mundo está de volta para o Natal." Roberta respira fundo, sentindo a paz entrar por seus pulmões junto do ar. Tudo parece certo outra vez ao se ver rodeada pela família, por todas as pessoas importantes de sua vida.
"Pronta para ir pra casa?..." Alice chega da porta e Roberta se levanta, contente por poder ficar de pé outra vez.
"Prontíssima!'
Logo entra uma figurinha miúda correndo pela porta.
"Mamãe! Mamãe! A gente veio te buscar!"
Roberta se abaixa para pegar a filha, mas sente tudo doer e precisa parar.
"O que aconteceu?" Diego vem logo atrás e a faz se sentar na cadeira ao lado.
"Nada, só me esqueci da cirurgia... Que droga..."
"Precisa tomar mais cuidado, se não vai ter que ficar aqui mais tempo."
"Deus me livre! Eu salto pela janela!"
Diego solta um riso descontraído, mas ao mesmo tempo pensa que ela realmente poderia fazer isso.
Nina se debruça no braço da cadeira e encara Roberta.
"Isso ia ser muito feio, mamãe."
Roberta ri enquanto Nina recosta a cabeça em seu ombro.
"Não vejo a hora de estar de novo em casa. Eu detesto hospitais, detesto o cheiro, a comida, tudo... E todo mundo me rodeando..."
Diego dá um beijo em sua testa e se abaixa frente a ela segurando suas mãos.
"Bom, em casa também iremos ficar te rodeando, não é filha?" Ele olha para Nina que balança a cabeça vigorosamente. "Você vai ter dois enfermeiros cuidando de você dia e noite até ficar boa."
"Eu vou ler pra você dormir, mamãe."
"Mas eu já estou boa..."
"E se teimar o que faremos, Nina?" Diego olha para a filha que faz um ar de brava para a mãe.
"Vai ficar de CASTIGO!"
Roberta não resiste e ri, dando um beijo em Diego ao se levantar.
"Obrigada por estar sempre aqui quando estou prestes a cair."
Ele respira fundo.
"Você é meu mundo. Como poderia deixar você cair?


***

Dias depois

***

Dona Carmem olha uma e duas vezes, mas não sabe se toca ou não a campainha. Não é uma coisa que costumava fazer, ir à casa de estranhos sem ser convidada, mas está certa de que precisa. Seu filho está furioso e se recusa a sair do carro. Ao longe ela ouve o neto reclamando, mas não faz nada para ajudá-lo. Não dá, só consegue olhar para a campainha e pensar "O que estou fazendo?".
"Eu disse que isso era loucura! Vão chamar a polícia, isso sim!" Dizia Lúcio, enquanto coçava a rude barba negra que lhe cobria quase todo o rosto. Estava emburrado, apesar de finalmente ter aceitado acompanhá-los na visita.
"Não fizemos nada, pai." Seu filho vinha ao lado dele, exausto por tentar tirá-lo de dentro do carro. "Anda, vamos lá ver a garotinha, só vamos ver como ela está, não é nada demais. Você salvou ela, não se esqueça disso."
"Estou vendo que essa gente vai é nos acusar de sequestro."
"Deixa de bobagem, pai." O garoto se vira para a avó. "A senhora precisa dizer pra ele que é bobagem, por favor!"
Carmem respirou fundo e apertou a campainha.
"É, é bobagem mesmo!"
Os três ficaram em silêncio a espera de alguma resposta, mas nada ficou mais fácil quando em alguns minutos eles entraram naquela casa. Nina veio correndo ao saber quem estava no portão e deu um abraço apertado em Dona Carmem assim que a viu. O pai estava com ela e sorria para os três, convidando-os a entrar.
"Vem ver o pinheirinho, dona Carmem!"
Nina saiu arrastando a senhora para dentro enquanto Diego conversava com Lúcio e o filho.
"A diretora da escola nos contou tudo. Eu e a Roberta pretendíamos visitar vocês quando ela melhorasse."
"Mas ela vai ficar bem logo, né?" O garoto franzino perguntava sem parar. "A baixinha ficou louca de preocupação. A mãe dela não corre risco, né?"
"Não, não corre mais riscos, mas vai ficar em repouso por um tempo."
Todos se sentaram no sofá da sala e logo Roberta desceu as escadas para saber quem estava lá.
"Mamãe, a dona Carmem veio me visitar!" Nina correu até a mãe e Diego foi ao seu encontro, segurando-a pelo braço.
"Roberta! Porque não me chamou?"
"Ah, para, eu já estou bem..."
"Desculpe, não queríamos incomodar." Dona Carmem se sentiu envergonhada de repente.
Todos se sentaram na sala enquanto Nina ia e vinha mostrando a eles os enfeites que haviam comprado para colocar no pinheiro de Natal.
"Não tem que se desculpar." Roberta respondeu. "Eu não sei como agradecer à vocês..."
"Espere, filha." A senhora a interrompeu. "Não vim aqui para receber seus agradecimentos, eu é que quero agradecer."
"Pelo quê?" Pergunta Diego.
Dona Carmem contou à Roberta e a Diego o que aconteceu na noite em que seu marido faleceu. Disse tudo que Nina havia sonhado e deixou os dois bastante assustados.
"Você sonhou mesmo com ele, filha?"
Sentada no tapete no chão da sala, Nina ficou entrelaçando os dedinhos, olhando para a mãe e depois para o pai. Sempre fazia isso quando sentia que estava encrencada.
"Fiz alguma coisa feia?"
"Não, meu amor." Diego estendeu os braços e ela veio para seu colo. "Não fez... Só estamos curiosos."
"Você não tinha nos contado esse sonho, filha."
"Eu esqueci, mamãe... Eu sonho muitão de coisa."
"Parece que foi um sonho bonito." Diego diz à filha. "Esses sonhos bonitos só vem para menininhas muito especiais, sabia?"
"Verdade?"
"É."
Dona Carmem estendeu os braços para abraçar Nina.
"Só para pessoas de coração muito puro, meu anjo."
A menina ficou olhando por cima dos ombros da senhora enquanto a abraçava. O pinheirinho coberto de enfeites brilhava com as luzes douradas e aquele dia tinha o mesmo aroma e a mesma delicadeza de seus sonhos.

***

Os últimos dias do ano chegam...

***

Na véspera de Natal, enquanto os pais se beijam no sofá da sala, enquanto a senhora da oficina, com seu filho e neto, ouvem a coleção de discos do Seu Ângelo, e enquanto a professora, a moça da padaria, seus coleguinhas da escola, seus avós, padrinhos e todo resto mundo está comemorando o Natal ou simplesmente vendo televisão, Nina está na cama sonhando. Entra outra vez naquela linda sala de Natal, agora solitária. Em vez de olhar os enfeites, como sempre faz, ela vai direto para a janela. Atrás do vidro passam suas últimas lembranças: A mãe na praia vestida de branco, com os cabelos soltos, um buquê nas mãos e um sorriso engraçado enquanto caminha até o pai, que está com cara de bobo. Não havia muitas pessoas no casamento, apenas os avós, os tios e padrinhos. O mar ao longe deles estava calmo naquela tarde.
Nina esperou sua vez de entrar com as alianças e sentiu um frio na barriga quando todo mundo olhou para ela. Estava vestida com um vestido comprido e esvoaçante. Haviam colocado flores em sua cabeça e prendido seus cachinhos no alto. Estava, segundo a vovó Eva, igualzinha à mãe quando pequena.
Deu um risinho e encolheu os ombros quando o pai piscou para ela ao chegar ao altar. Ele estava com um terno escuro e os cabelos muito arrumados, nunca o tinha visto tão elegante. A mãe estava tão linda que era impossível não ficar olhando o tempo todo para ela.
Um homem sério disse umas palavras estranhas e Nina ficou com muito sono enquanto ouvia, mas quando o pai recolheu as alianças da almofadinha que ela trazia, não conseguiu mais piscar diante da cena.
"Eu, Diego Maldonado, te tomo por minha esposa e prometo te amar, te respeitar e te cuidar por todos os dias da minha vida..." E ele beijou a mão de Roberta antes de prosseguir. "Porque você é e sempre será a minha vida."
Quando ela foi colocar a aliança nele, suas mãos estavam tremendo, mas seu olhar era muito forte, como um raio que o atravessava e o deixava tonto. Estava certa, estava pronta e feliz.
"Eu, Roberta Messi, te tomo por meu esposo, por meu amor, meu companheiro... E prometo te amar, te respeitar e te cuidar por todos os dias da minha vida."
Quando eles se beijaram, Nina ouviu os aplausos dos poucos convidados, mas seus olhos estavam voltados para o mar. As ondas pareciam dormir e as nuvens estavam lentas, quase paralisadas. O sol se punha sem pressa em um tom alaranjado brilhante. Talvez ninguém tivesse visto como as águas pareciam cantar uma canção naquela tarde, uma canção tranquila e arrepiante. O mar era mágico como os sonhos.
Naquele dia Nina caminhou com os pais pela areia da praia desejando que o dia não terminasse. Correu pelas ondas, riu e brincou até ficar cansada. Depois ouviu quando eles conversaram bem baixinho atrás dela, sentados abraçados em frente ao mar.
“Até o fim?” Ele perguntou.
“Até o fim.” Ela respondeu.
Nina pôs a mão no vidro invisível da janela e desejou acordar logo para viver outro dia divertido e colecionar mais lembranças assim. Um dia teria tantas alegrias para pendurar na árvore de Natal quanto o Seu Ângelo teve... e como seus pais têm. Centenas e centenas de alegrias para enfeitar seu próprio pinheirinho. E a sua vida também será tão linda como a de todos eles.

Comentários

  1. Depois de um longo domingo de Enem, ler essa história a qual sou apaixonada , me trás tanta paz. Posta mais ❤

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