Cap 104 - De encontro ao céu

 O trajeto todo até a mansão é alegre, mas também composto de momentos de silêncio onde reconstrução da esperança em uma vida tranquila no futuro acontece gradativamente. Os pedaços vão chegando devagar e encontrando seus encaixes perfeitos. Logo todos já são capazes de sorrir sem qualquer receio.

Quando finalmente chegam à porta, Sílvia os recebe com entusiasmo.

-Preparamos um verdadeiro banquete para comemorar!

-Isso muito me agrada. –Tomás comenta. –Já vamos comer?

-Tá morrendo de fome, meu filho? –Pedro dá um tapa em sua nuca.

-Ele tá sempre morrendo de fome. –Carla implica.

-Até parece que vocês são diferentes. Só sou realista!

-Ainda não está tudo pronto, mas vocês podem esperar na sala. –Sílvia os convida.

-Papai chegou! –Os gêmeos descem as escadas correndo de encontro a Leonardo, que vem com a neta.

-Trouxe a Nina! –Bruno se adianta. –Podemos brincar com ela, papai?

-Claro, mas eu também quero brincar!

Roberta arregala os olhos para Diego.

-Seu pai quer brincar??? –Cochicha rindo.

Ele ergue os ombros, totalmente confuso.

Nisso, todos se encaminham para o sofá da sala, enquanto Nina, Danilo, Bruno e o Sr. Leonardo Maldonado se sentam na escada, brincando com bloquinhos e outros jogos. As gargalhadas das crianças e do empresário logo se sobrepõe a conversa, deixando todos impressionados.

-Difícil acreditar que seja realmente ele. –Alice olha por cima dos ombros.

-É, as coisas mudam. –Pedro também olha. –Ainda bem, né?

Os dois se olham e sorriem com cara de idiotas.

-Aí tem... –Roberta levanta as sobrancelhas, desconfiada.

-Você conta ou eu conto? –Alice pergunta a Pedro.

-Conta você.

-Não, conta você.

-Deixa que eu conto. –Tomás interfere. -1, 2, 3, 4, 5...

-Tá, tá, tá! –A patricinha ergue as mãos com um enorme sorriso. –É que o Pedro e eu estamos noivos! Nós vamos nos casar!

-Sério? –O queixo de Carla cai. –Parabéns!

-É! Parabéns Barbie e Ken! –Roberta zoa. –E quando vai ser o casamento?

-Quando eu puder dar tudo que a minha princesa quiser. –Pedro abraça a namorada.

-Vish... –Tomás revira os olhos. –Então não vai sair tão cedo esse casório.

-Ah, deixa o cara, Tomás! Parabéns Pedrão! Parabéns Alice! –Diego se vira para os amigos. –Desejo toda felicidade do mundo pra vocês. –E se vira para Tomás. –E você? Porque em vez de encher eles, você também não se casa, Tomás? Vai ficar enrolando a Carla até quando?

-Eu? Eu não estou enrolando ninguém! A Carlinha sabe que eu sou louco por ela, mas eu sou livre demais pra isso.

-Ah, é? –A garota põe as mãos na cintura, indignada. –Explique-se melhor, Tomás!

-Bom... Bem... É... –Ele fica perdido. –Eu sou tipo... tipo... tipo a Roberta!

-Eu? –A garota se assusta ao ver seu nome entrar na conversa.

-É! Tipo, eu quero um relacionamento duradouro, mas sem papel, cerimônia, essas coisas! É bobagem! Um rito social sem valor.

Roberta se levanta do sofá.

-Que foi? –Diego segura sua mão quando ela tenta sair de fininho.

-Vou ver se a Nina não está dando muito trabalho pro seu pai.

-Ah...

 Com o alívio de poder sair dali, ela vai até o sogro, que distraído tenta montar peças de um brinquedo estranho e colorido que se parece muito com uma centopeia amassada.

-Oi...

-Oi, Roberta! –Leonardo se vira para ela. –Eu sou um desastre com brinquedos. Acho que já quebrei esse.

Ela sorri e ele continua.

-Está vendo como a Nina gosta de brincar com os meninos? –E aponta para as crianças à sua frente. –Tem que trazê-la mais vezes.

-Com certeza eu vou trazer. Eu quero muito que a minha filhota cresça perto deles, perto de você, da Sílvia, do Franco e até da minha mãe.

Leonardo ri.

-É, eu sei que minha mãe nunca vai mudar, mas ela é muito boa e eu a amo muito.

-Então diga isso a ela mais vezes. Eu nunca disse o suficiente para ninguém e estou treinando agora, tentando recuperar o tempo perdido.

-É, acho que preciso mesmo. Mas... Eu estou querendo te perguntar uma coisa.

-Pois pergunte. –Ele fica sério.

-É sobre o Leonel. Eu não soube mais nada dele.

-Bom... Ele já foi embora, acho que foi ontem. Eu conversei com ele pessoalmente. Seu pai está bastante arrependido.

-Se é verdade, porque não veio falar comigo? Foi pra Itália sem nem sequer olhar pra minha cara.

-Bom... –Leonardo pensa um pouco. –Acho que talvez ele precise de tempo pra aprender algumas coisas, assim como eu precisei. Eu sei que ele está extremamente envergonhado e não consegue te encarar. Mas ainda vai voltar pra se desculpar, eu garanto.

-Se ele não voltar já será o suficiente para eu desculpá-lo.

-Não diga isso, ele é seu pai.

-Eu não tenho pai. Nosso caso não é como o seu com o Diego. Ele não me criou, foi apenas o doador do esperma. Minha mãe foi toda minha família durante dezessete anos. Eu só achei que depois de tudo, ele fosse tentar se redimir, mas vejo agora que é um covarde.

-Tudo bem, mas esquece disso agora. Sua família já não é apenas sua mãe. Todos nós somos sua família e estamos com você.

Ela sorri com espanto. Nem consegue crer que está conversando com o mesmo Leonardo que sempre a repudiou. Finalmente parece que as coisas ficarão bem entre eles.

-Obrigada.

-Não, eu que agradeço. Olhe o que meu filho se tornou ao seu lado. Deixou de ser um garoto para se tornar um homem. Está sóbrio, seguro de si, responsável... E acima de tudo é um pai para minha neta como eu nunca fui para ele!

-Ele é um pai muito babão, isso sim!

-E como não seria? –O empresário ergue as sobrancelhas. –Vocês dois tem uma criança linda, inteligente e muito meiga. Eu fui um idiota por não ter visto como era abençoado por ser avô dela. Você me proporcionou tudo isso, Roberta, e eu não merecia. Não sei como me desculpar e te agradecer ao mesmo tempo.

O canto esquerdo dos lábios dela sobe em um sorriso.

-Que tal um abraço?

O homem fica um tanto impressionado com a resposta. Pensa que se Leonel soubesse que sua filha guarda um coração generoso debaixo desta casca rude, não teria ido embora com tanto receio. E ao abraça-la, o empresário sente adotá-la como filha. Ambos sabem que estão além de qualquer julgamento precipitado.

***

Depois do almoço, da algazarra de conversas na mesa lotada e de um bom soninho das crianças, é chegada a hora de partir. A tarde já está terminando e todos que voltar para casa. Os amigos seguem à frente enquanto Roberta e Diego se despedem de Sílvia e Leonardo.

-Pra onde vocês vão? Pra casa da Eva? Podem ficar aqui. –Sílvia convida. –A menina tomou um banho tão gostoso e está dormindo tão tranquila, dá uma pena que a levem.

-É que nós queremos muito ir pra casa. –Responde Diego. –E acho que a Nina vai gostar de acordar no quartinho dela.

-Nós estamos morrendo de saudade da nossa casa. –Roberta explica. –E já deixaram tudo limpo e organizado pra gente voltar.

-Sendo assim, não queremos atrapalhá-los. –Leonardo abraça a mulher. –Mas saibam que nossa casa está aberta para vocês a qualquer hora, sempre que quiserem.

-Obrigado, pai.  

Todos se despedem e saem. Diego leva a filha dormindo em seu colo até chegar ao carro, onde a coloca no bebê-conforto com todo jeito. É sempre muito cuidadoso e protetor e Roberta não brincou quando disse que ele era mesmo um babão. E depois quando o casal entra e pega o rumo de casa, a conversa é tão entusiasmada que faz o coração de Diego acelerar. Os sorrisos dos dois parecem ter se parafusado em seus rostos. Diego está tão leve e feliz que é como se estivesse dirigindo de encontro ao céu, onde nada mais poderá atingi-lo.

***

 Quando chegam à rua e avistam o portão da casa, eles trocam olhares de saudade. Ao entrar, guardar o carro e abrir a porta da frente, sentem-se banhados por um sentimento de fim. Tudo voltou realmente ao seu equilíbrio. Nada de medos ou enganos, nada de angústias. Apenas a sensação de felicidade imediata e constante, uma certeza de muitos dias felizes naquele ambiente tão acolhedor.

-Está de novo como antes. –Roberta observa em volta as janelas de madeira com vidros transparentes, depois seus olhos param no sofá escuro da sala e no carpete felpudo onde costumava se sentar e jogar vídeo game com Diego. Quando olha para as paredes repletas de fotos, seu estômago chega a se contrair de alegria. Algumas fotos são de shows com a banda, outras são de Nina, dela, de Diego, dos dois juntos, dos dois com Nina, e assim vai. São sinais de uma história longa e bem vivida, cheia de momentos maravilhosos. E nesses quadros ela vai entendendo então como é viver. Não se deve guardar imagens de tristezas na mente, assim como não se tira fotos de momentos ruins e os pendura na parede. Há de se preencher o vazio sempre de coisas boas para sempre poder ver a beleza que existiu e que fez cada segundo vivido valer a pena.

-Lar doce lar! –Diego beija sua bochecha e a desperta do transe.

-Finalmente...

-E aí? Vamos subir pra colocar essa pulguinha no berço?

Roberta ri.

-Vamos.

 Eles sobem as escadas e no corredor do segundo andar, abrem a porta da direita, do quarto da bebê. Está ainda mais bonito que antes. Há vários presentes espalhados e novas roupas de cama, objetos e detalhes diferentes.

-Coisa das mulheres da família, eu não pude impedir. –Ele diz enquanto coloca a filha no berço. –A Sílvia quis ajudar, a minha irmã também, aí juntou a Alice, a Carla... Incrível como a Alice não encheu isso aqui de cor de rosa...

 Roberta vai até Diego sem dizer nada e sela os lábios nos dele, fazendo-o se calar instantaneamente. Em seguida o abraça bem forte, ficando em seus braços sem previsão de sair.

-Eu amo tanto você... Amo tanto a Nina... Amo tanto a nossa família...

-Eu também minha linda. –Ele beija o pescoço dela e acaricia suas costas. –Amo mais do qualquer coisa no mundo.

 E nesta noite eles vão para o quarto segurando as mãos um do outro como quem tem medo de se perder no caminho, e vão andando devagar e admirando cada pedacinho da casa como se fosse a primeira vez. É como um ninho, como uma toca ou um colo bem quentinho a trazer proteção. E quando a noite chega, o céu como um manto coberto de estrelas, traz o conforto e o sossego de um novo tempo a começar.


PS: Já estou escrevendo o capítulo especial que me pediram, estou caprichando ao máximo pra vocês. Beijinhos ;)