Cap 96- O futuro pede passagem

 Os dias passam rapidamente quando se implora a eles que demorem muito a passar. Assim, a avenida movimentada dos planos para o futuro não sai dos congestionamentos de ideias confusas e nenhuma decisão fica realmente certa na mente dos rebeldes.

***

 Os namorados se trazem pelas mãos até a porta de casa, como em uma cena de filme antigo. A casa de Eva e Franco, nesta noite, tem um sossego poucas vezes encontrado em todos aqueles dias.

-Até amanhã olhos lindos...

Diego dá a impressão de não querer deixá-la ali e voltar para casa depois de tanto tempo juntos.

-A gente se vê amanhã, então.

 Ela lhe dá um beijo e um sorriso de despedida e assim que fecha a porta encontra Alice, que da sala, havia visto toda a cena.

-Parece que fomos bem de feriado...

-Bem? Não poderia ter sido melhor! –Roberta se joga risonha no sofá, com brilhos e faíscas saltitando em volta.

-Que bom, porque por aqui as coisas ficaram tensas, tá!

-Por causa do Otto?

-Não, meu pai aceitou ajudar a procurar o tio dele.

-E encontrou? –Roberta se anima.

-Sim... –Alice fica feliz ao lembrar. –Ele parece que gosta muito do menino, ficaram super felizes quando se encontraram, foi emocionante.

-Ah, que bom... Aquele pirralhinho é gente boa... Mas, então...

-O problema é que andaram rondando as nossas casas!

-As “nossas”?

-É... Primeiro eu vi um vulto na casa do Tomás, quase tive um treco! Depois a Eva viu aqui e agora pouco o Pedro me ligou dizendo que a mãe dele levou o maior susto hoje mais cedo com um cara rondando a casa dela. Todos já colocaram seguranças e acionaram a polícia.

-Vocês tem alguma ideia de quem possa ser?

-Os meninos desconfiam...

-Do Pablo?

-É...

-Eu não duvido, mas o que ele iria querer? O Otto nem tá aqui!

-Mas eles não sabem disso...
-Isso tá estranho...

-Então você acha...

-Acho que é melhor deixar tudo nas mãos dos adultos, porque estamos no final do ano e a única coisa que me importa são as provas finais e o vestibular!

-Tem razão... –Alice olha despercebida para si mesma. –E você já sabe...?

-Eu não sei de nada!

 E Roberta se levanta deixando a amiga no vácuo.

-Ei! Eu ia...

-Me perguntar do futuro, e eu só to a fim do presente!

 A garota sabe bem o que quer e precisa fazer, sabe que nesse momento o que mais precisa é de um pouco de sossego mental para planejar o ano que viria e que mudaria todas as estruturas de sua vida, mas para isso precisaria viver o hoje e fazer com que ele tornasse o amanhã desejado e com um passo aperfeiçoado por dia fazer um futuro como se espera.

 O colégio está na contagem regressiva para se despedir dos alunos e esses à primeira vista não estão nem um pouco abalados por saírem dele.

-Acho que esse lugar sim, vai ser o único do qual vou sentir falta... –Tomás adentra o porão na frente dos outros cinco que vem em seguida fazendo barulho.

-Acho que o que fizemos aqui vai ficar na história.

-É verdade... –Roberta admira a pose de Diego ao relembrar.

 Todos se acomodam como tantas vezes já fizeram e já vão pegando o seu lugar. Os instrumentos vão aderindo às mãos e a suavidade dos sons começa. Um som de guitarra alucinante, uma bateria estrondosa e vozes apaixonadas pela música.

 Depois do ensaio eles ainda permanecem e tem coisas a dizer...

-Vocês já sabem o que vão fazer?

 Todos olham para Pedro, a pergunta era tão temida quando necessária.

-Tá falando de faculdade ou de tudo?

-De tudo, Carla. A gente vai acabar se separando porque não vamos dividir o mesmo colégio, aqui moramos todos e nos vemos toda hora.

-Mas nada vai atrapalhar a banda. –Roberta se adianta. –A gente vai ter mais liberdade pra fazer os shows, pra sair, pra decidir o que a gente quer. Afinal quase todos aqui já tem 18, né?

-É, só falta eu... –Tomás levanta o dedo se sentindo “o atrasado”.

-O bebê da banda!! –Pedro zoa o amigo. –Não se preocupa que a gente cuida do bebê pra ele não fazer burrada...

-Ha, ha, ha... Prefiro a Carla... –Ele puxa a namorada. –Vamos levar muitas coisas boas daqui...

-Muitas... –Alice concorda olhando para Pedro que a abraça e completa.

-E a gente vai se manter unido.

-Somos uma banda e nosso sonho é com a música!

-É isso aí! –Diego segura a mão de Roberta. –Juntos somos mais fortes para realizar o nosso sonho.

-Em pouco mais de um mês estaremos fora daqui! O mundo é nosso! –Tomás grita e anima a todos.

 Eles riem e se divertem ainda uns com os outros até que fica tarde demais e dois dos casais sobem para dormir deixando um para trás.

-Ah, vem cá! –Diego a trás pela cintura feliz de estarem finalmente sozinhos de novo. –Sabe que o Tomás disse uma coisa que não saiu da minha cabeça.

-Aquele ali? Que coisa ele disse?

-Que a gente vai levar muita coisa boa...

-Apesar de tudo que aconteceu de ruim, o Elite Way nos deu nossos amigos, a banda... E a gente, claro...

-Eu nunca imaginei que esse maldito internato me traria a melhor coisa que já tive na vida.

-Gosta tanto assim de ter uma banda? –Ela sorri travessa.

-Hã... To falando de você...

-Eu sei!

-Convencida! –Diego tem os olhos negros e profundos infiltrados nos dela, doce e encantado como sempre.

-Vai dizer que eu não posso?

-Claro que pode... Eu quero que você tenha toda certeza que eu te amo e que você é a pessoa mais importante da minha vida... Mais até que a minha vida...

 Roberta fica alguns segundos com os braços em volta do pescoço dele, somente repetindo ao coração o que havia ouvido, para que este não se esquecesse.

-É curioso...

-Ué? Eu me declaro pra você e isso é curioso?

-Mas é! –Ela está calma. –Você dizendo assim parece que eu tenho o seu coração dentro das mãos...

-E tem... Cadê o que é curioso.

-É que um segura o coração do outro... –Ela filosofa para si mesma, mais do que para ele. –Por isso quando estamos longe, quase morremos... Porque é impossível sobreviver com o coração batendo na mão de outra pessoa.

-Quanta metáfora...

-Foram metáforas, né?

-Olha o vestibular, hein...

-Nãão... –Ela pula no sofá e o leva junto. –Agora não! -Roberta puxa Diego pela gola da camisa dando-lhe um beijo que o deixa tonto.

 Os minutos que podiam se beijar e dizer declarações com os sentidos seria curto enquanto estivessem ali. Mas o internato cheio de regras seria deixado para trás em breve e eles poderiam mudar tudo. No entanto a liberdade, misturada com o desejo jovem de experimentar somente o prazer, a alegria e o sucesso, pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição.

 É preciso aprender a medir a distância no voo livre passarinho...

-E aí, quer subir?

-Não.

-Que direta você! –Diego ri.

-Sempre.

-Eu adoro isso...

-E eu amo você... –A garota vai se acolhendo nos braços dele. –Vou sentir falta disso...

-De me amar?

-Tá engraçadinho... –Ela é irônica e ele volta a rir. –To dizendo que vou sentir falta da gente poder namorar no porão antes de dormir...

 Roberta vai adquirindo o tom mais suave. O tom que só tinha quando estava com ele.

-Mas a gente ainda vai se ver sempre...

-Nem é a mesma coisa.

-Por quê?

-Nada de café, almoço e jantar juntos... Nada de ir até a porta do quarto depois dos ensaios, estudar na mesma sala...

-Mas a gente também não vai ser vigiado no namoro. –Ele recebe a cabeça dela no peito e os dedos vão brincando nos cachos. –A gente vai ficar livre pra poder namorar e muito!

-Gostei disso...

-Eu sei... Talvez a mudança seja melhor do que imagina...

-Eu não tenho medo de mudança, eu gosto de mudança... –Ela olha para o nada. –Se nada mexer na gente já tá ótimo...

-É o que eu digo... Talvez mude pra melhor.

 Roberta se levanta e se senta no sofá, desconfiada.

-Você tá aprontando...

-Claro que to!

-O que?

-To aprontando... –Ele vai escorrendo para mais perto dela. –Pegar... Você...

-Não!

 Roberta grita quando Diego pula sobre ela a morder seu pescoço.

-To aprontando um futuro muito lindo pra nós dois...

-Lindo?

-Perfeito...

 Ele vai escanteando um sorriso cheio de segredos sobre o rosto de Roberta, que continua intrigada. Ela afasta os lábios para a descida do beijo dele que se introduziria febril.

 A sede que tem dele a faz tragá-lo com voracidade, ao mesmo tempo em que é delicada em cada toque interno que leva nele. Como uma fera a se alimentar lentamente da caça de modo a experimentar os segundos da experiência de saciação.

 Diego está por cima dela, mas sente que não controla, mas é controlado.

-Que garota é essa? –O pensamento durante o beijo ferve. –Entra em mim e me enlouquece a cada dia mais?

 E conforme pensa, percebe o desejo só a aumentar, mas estão no porão, e ele se lembra isso a todo segundo para se conter.

 Eles finalmente sentem falta de respirar, mas ao se largar e olhar carinhosamente, cerram os olhos para ver algo que tem dentro. De modo singelo eles juntam os lábios perfeitamente. Uma sensação quente, molhada e dócil esticada alguns segundos mais naquele presente que tinham para aproveitar antes que o futuro pedisse passagem...

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