Cap 81- O pequeno mistério

 Roberta tinha ficado todo o tempo somente observando sem interferir e sem forças para reagir ao que não podia entender. Não imagina o porquê da briga, não percebe que Pablo estava consigo na cama, nem ao menos que tivesse lhe beijado.

 Ainda não tem ordem nas ideias e quando o namorado por fim ganha a briga e vem interrogá-la, se mostra ainda mais confusa.

-Anda! Fala!

-O que? –Roberta está nervosa. –Eu não sei o que aconteceu.

-Não sabe?

-Não! –Ela olha para o local e leva a mão à cabeça dolorida. –Eu não lembro...

-Não lembra... –Ele está furioso. –Pois eu nunca vou esquecer!

 Diego sai, plantando um terror no olhar de Roberta que o chama em vão. Ao se levantar para correr atrás dele, cai de volta na cama, ainda sem equilíbrio. Começa a sentir-se cada vez pior, uma dor aguda vinha lhe esfriar o estômago.

-Eu... –Pablo se levanta e tenta falar com ela.

-O que aconteceu?

-Como? Você não sabe? Você me chamou, a gente se beijou... –O monitor mente.

-Que!? –Roberta enlouquece. – Tá maluco? Eu amo o Diego e eu nunca ia fazer isso com ele! Nunca!

-Mas fez... –Pablo chega perto sorrindo como um doente. –Você me ama... Só precisa entender isso...

 E ao segurar os braços dela, recebe um chute na canela com toda a força de uma criança.

-Larga ela idiota! –O rostinho arredondado de traços marcantes Roberta se lembra bem. Tinha um bico irreverente e vermelho entre as grandes bochechas.

 Pablo ainda tenta reagir, mas vê que não tem mais nada que fazer ali, está muito machucado e não aguentando mais nada. Nem mesmo um chute. Sai sem alardes e sem olhar para trás.

-Você? –Roberta olha para aqueles 10% de homem que tinham sido sua defesa e não acredita na própria visão.

-Eu mesmo! Agora senta pra não cair, linda!

 E Otto segura a mão dela e a faz sentar na cama, pulando para sentar do seu lado com as perninhas roliças a balançar.

-Que tá fazendo aqui, pirralho?

-Nada demais, me escondendo.

-Como veio parar aqui? Você tava no cruzeiro!

-Vim com o Pablo e com o Rodrigo. A minha tia, lembra dela? A Fran? Que você ficou com ciúme dela com o seu namorado? Pois é, ela queria me jogar em um orfanato fedorento onde eu ia morrer de fome, até poderia pegar alguma doença grave e morrer!

-Sério? –Roberta presta atenção.

-Não, na verdade ela ia me levar pra casa da minha avó, mas a história do orfanato é melhor, não é?

-Pirralho, tá achando que eu tenho tempo pra jogar fora?

-Não, desculpa, eu sei que você quer saber o que aconteceu, deixa, eu vou te contar.

-Começa me falando como foi que eu apaguei. –Roberta passa a mão no vermelhão que começa a piorar.

-Acho que você pode se zangar... –O menino dos olhos vibrantes e cabelos negros encara Roberta com receio. –É que a culpa foi minha, eu tava tentando consertar a porta do guarda-roupa pra ninguém me ver, mas nada dava certo, daí eu peguei o martelo e também não deu, foi quando eu joguei ele pra trás e acertou em você e formou esse cocó que tá na sua cabeça...

-Formou o que?

-Cocó ué! Um galo... –E o rostinho infantil dizia tudo seriamente e às vezes entre sorrisos simpáticos.

-Hã tá, mas e depois?

-O Pablo te encontrou, eu entrei no guarda-roupa como faço sempre e...

-Ah, então você era o fantasma da Carla?

-É... A Carla é gente boa, teve até o maior rolo com o namorado por minha culpa. Ela me traz comida gostosa, não é como o Pablo que só me traz arroz...

-E porque eles te deixaram aqui? E não te levaram pra sua avó?

-Sabe, eu me escondi na mala deles, não, era um baú porque era muito grande e quando me encontram eu contei a história do orfanato.

-E eles engoliram?

-Sim, mas eu contei a verdade depois como fiz com você. –Ele sorri fazendo Roberta enlouquecer.

-Mas, mas que propósito tem isso que você me disse?

-E o que um “propósito”?

-Como?

-Sim, o que é? É quando você algo por querer, querendo?

-Ai, eu não acredito. –E Roberta abaixa a cabeça entre as pernas amassando os cachos com os dedos, ainda mais nervosa.

 Por um momento caiu em si e percebeu que estava falando com um menino que não tinha nem 8 anos de idade direito, uma criança que nem ao menos entendia o que estava acontecendo e mesmo assim precisaria dela para resolver a bagunça de sua mente.

-Então tá menino, me fala mais.

-Os portugueses me acharam no baú e me disseram que eu poderia ficar aqui se ajudasse eles.

-Com o que?

-Não posso contar, se não eles me mandam embora...

-Tá ok, mas o que aconteceu depois que eu caí com a martelada, lá?

-Sabe, foi muito engraçado, parecia o filme “O pestinha”...

-Nem imagino quem seja o pestinha... –Roberta fala sozinha, mas Otto nem percebe a indireta e continua falando.

-Eu me escondi, como te disse, mas do meu guarda-roupa vejo tudo, vi quando o Pablo te levou pra cama, ficou falando uns negócios melosos pra você, parecia novela das oito, mas depois ele te beijou, não vi muito bem, mas acho que beijou, que inveja dele...

-E... Não sou babá não, tá?

-Nem poderia, babás tem que ser feias pra gente não se apegar demais e sofre quando elas vão embora, mas então o seu namorado apareceu, ele é seu namorado ainda, né? O menino do topete?

-Nem sei... –Roberta se entristece.

-Bom, ele não gostou nada de ver você com ele, sabe, te abraçando daquele jeito e então meteu pancada nele! Que nem no Jackie Chan! Pá! Pá!

-Ai meu Deus, eu preciso falar com o Diego, ele não pode ter acreditado nisso.

 E deixando o menino Otto, o pequeno mistério do quarto 16, o fantasminha de Carla e os olhinhos curiosos que sempre espiavam todo mundo com suas fantasias, ela parte pelo jardim atrás de Diego, roda todo o colégio, mas não o encontra. Cada porta que abria era uma esperança, mas por final cada porta já era mesmo uma agonia. Não adianta, ela não o encontra em nenhum lugar, até que ela mesma é encontrada por Alice.

-Roberta, o que tá acontecendo? –A amiga desce as escadas da sala de estar rapidamente.

-Você viu o Diego?

-Não, eu disse que você queria falar com ele mais cedo e que ia esperar no quarto 16, mas depois disso não o vi mais. –Alice percebe os olhos de Roberta diferentes. –O que aconteceu? Vocês brigaram?

-Não sei, acho que sim.

-Não entendi.

-Eu vou procurar o Diego...

-Nada disso, já é tarde! –Ela segura Roberta pelo braço. –Você vem comigo, vai me contar o que aconteceu.

 E a noite cai sobre todo o colégio com uma densa fumaça de presságios ruins, com uma sensação de que algo estava preso por um fio.

 Na manhã seguinte, Roberta ouve os comentários na “rádio-corredor” : O Diego bebeu a noite toda, chegou carregado... Não, não é verdade, ele foi com a Vitória pra um lugar afastado... Que ideia! A gente sabe que o que de fato aconteceu é que ele e a Vitória chegaram juntos hoje de manhã e que o Diego não tava com uma cara boa. A interesseira devia tá tirando proveito... Mas e a Roberta? Não é mais a dona do gato?

 E esse último comentário foi o que mexeu mais com a garota, mas ela não queria chorar, então o que fez foi agarrar a menina do primeiro ano pelos braços, jogar contra o armário do corredor e dar o aviso:

-Não quero ver meu nome na boca de fofoqueira de novo, ou o caldo vai entornar! Tão me ouvindo?

 As duas meninas que estavam juntas perceberam que aquilo era para elas também e saíram amedrontadas. Roberta tinha fúria nos olhos e muito medo também, além de uma angústia visível. Mesmo que jamais admitisse, as palavras que ouviu entraram em seus ouvidos como bala.

 A manhã passa e nada de Diego. Durante a aula de Vicente, pouco antes do almoço, ela não se aguenta e decide ir até o quarto dele, com a desculpa de pedir para ir ao banheiro.

 Ela vai com cuidado pelos corredores da ala masculina, abre a porta do quarto de Diego sem bater, que é de costume dela, não costuma se anunciar, era como um raio, que simplesmente aparecia assustadoramente linda na vida de todos de uma vez.

 O quarto está aparentemente vazio, ela dá a volta e percebe o chuveiro ligado. O rebelde sai em seguida com uma toalha na cintura.

-Oi. –Ela aperta os dedos, ansiosa. –Diego eu...

 Antes que eles possam falar qualquer coisa, Rodrigo bate e chama na porta, o que faz Diego tapar a boca dela com as mãos, puxar a garota para dentro do banheiro, onde tranca, ligando o chuveiro de volta.

-To no banho! –Ele aperta Roberta contra o azulejo.

-Tudo bem, é só um recado... –E Rodrigo entra no quarto e vai direto à porta do banheiro. –É seu pai, está outra vez aqui e quer falar com você. Cinco minutos na sala do Jonas.

-Ok!


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