Cap 70 - Segredos femininos

 Carla sente a necessidade de falar com alguém e como Alice não parece estar em um bom momento para conversa, resolve procurar Roberta.

 Passando pelos corredores ela encontra João.

-Você viu a Roberta?

-Não, não vi, mas é melhor ela e o Diego aparecerem logo, porque o Rodrigo e o Pablo estiveram na cantina procurando por eles.

-Vou mandar uma mensagem pra Roberta.

-Pra mim?

-Ai garota, que susto!

-Que foi? -Roberta ri acompanhada do namorado.

-Que foi que os portugueses estão atrás de você e do Diego!

-Pra que?

-Eles disseram pra que se a gente visse vocês era pra dizer que fossem pra sala da diretoria. –João informa.

 Os dois se olham e partem para lá enquanto que Carla outra vez fica desnorteada, afinal todos haviam esquecido que era esse o dia em que o resultado da competição de dança sairia.

 Ela então continua caminhando pelos corredores, mas se incomoda de estar sendo filmada, resolve então ir até o quarto 16, que era o único lugar em que aparentemente estaria sozinha.

 Ao abre a porta de madeira com um certo cuidado e ouve o rangido irritante que lembra aqueles clichês de filmes de terror. Ao encostar ela olha para os lados e se senta na cama, encosta a cabeça na cabeceira e por um momento parece cochilar.

-Ahhh!!! –Ela solta um grito muito alto e amedrontado seguido por um forte barulho.

-Que foi?

-Tomás, tinha alguém aqui!

 Carla se agarra ao namorado que tinha acabado de entrar no exato momento em que ela gritou.

-Alguém onde? Foi um sonho, Carlinha... –O rapaz segura sua cabeça contra o peito enquanto ela tapa a boca com a mão.

-Não foi um sonho, eu senti a respiração de alguém perto do meu rosto.

-Você não tava cochilando não?

-Bom, eu tava... Não sei, mas foi só alguns segundos eu acho... Mas depois que eu senti aquela respiração teve um barulho de alguém correndo, pensei que tivesse se escondido ali, entre aquelas coisas!

-Ali? –Tomás aponta para um guarda-roupa velho do outro lado, atrás de um monte de caixas empilhadas, com uma das portas semiaberta.

-O que você tá fazendo?

-Eu vou lá, ué! –Carla enlouquece com a aproximação dele do lugar onde ela achava ter alguém. –Não! Vamos sair daqui!

 E a menina vai arrastando Tomás para fora e saem os dois correndo pelo jardim.

-Porque você fez isso? Deve ser o Binho ou algum idiota tentando ter por medo!

-Eu não sei Tomás, eu... Eu to com medo, eu não volto naquele lugar!

-E como a gente vai namorar, minha filha?

-Ah, não sei, mas lá eu não entro mais...

-Deixa de ser boba, Carla! Eu vou voltar lá pra te provar que se tem alguma coisa, é gente mesmo, não é fantasma nenhum...

 E o rebelde retorna ao quarto, mas assustada, Carla o espera do lado de fora. Assim que ele entra ela fica ainda mais nervosa. Os olhos pressionados e o balançar das pernas a deixavam cada vez pior.

 Já na diretoria, Roberta e Diego dão de cara com: Eva, Franco, Leonardo e Sílvia. Ficam perplexos e não sabem nem o que dizer, apesar de não ser necessário. Na mesa do diretor está o comandante Zenon, mas conhecido como Sr. D pelos alunos, do seu lado os dois monitores e nas cadeiras os pais.

-Eu vou deixar vocês conversarem. –Sr. D se retira juntamente com Pablo e Rodrigo.

 Roberta e Diego nem entendem bem o que o homem pode ter dito a eles, mas resolvem somente ouvir (Medida de precaução).

-Nós temos que falar com vocês.

-Tô até vendo o que nos espera. –Diego fala de lado com Roberta.

-É sério. –Leonardo continua. –Vocês não podem namorar.

-Como é?

-Calma, Roberta! –Eva entra no meio. –Ele quis dizer namorar aqui ou deixar que o comandante veja vocês namorando, entendeu?

-Mas o que ele pode fazer?

-Ele pode acabar com a carreira acadêmica de vocês. –Leonardo responde o filho e Franco completa.

-Ele disse que se não obedecerem vocês serão expulsos, além de não conseguir mais entrar em nenhuma escola bem conceituada no Rio de Janeiro.

-Mas isso foi uma ameaça! Só porque ele é influente, ele não pode...

-Vamos por partes, Roberta. –Sílvia como sempre tenta amenizar. –A gente quer evitar que por enquanto vocês sejam expulsos, mas o Léo já está com um advogado para tirar esse homem daqui.

 Talvez um pouco mais aliviados, Roberta e Diego retornam, cada um, para seus quartos. Diego assim que abre a porta, tira de debaixo da camisa o diário que a namora havia lhe entregado no quarto, ao qual pediu que lesse somente quando estivesse longe dela.

 O rosto de Diego demonstrava a ânsia por devorar aquelas páginas. Assim que deita na cama e os olhos começam a passear pelas linhas, ele ri sozinho mordendo o polegar. Sai do mundo real e adentra novamente no navio... Naquele quarto quieto e harmonioso... Tem de novo o clima das férias e do sossego e até sente o cheiro dela outra vez como se ela estivesse outra vez com a pele sobre a sua.

“Não sei quanto tempo passou até eu me deitar sobre o peito dele. Fui beijando e descendo por ele todo.”

-Nossa, aquilo foi muito bom...

 Diego fala sozinho até que levanta subitamente com um certo parágrafo.

“Estava agarrado à minha cintura e me virou enquanto eu o beijava. Largou minha boca que estava inchada e começou a me beijar o pescoço. Desceu os olhos, que eu percebi que estavam abertos. Enquanto descia com os beijos ele contornava meu corpo com as mãos. Estava à cima de mim outra vez e sei que eu firmava todos os meus nervos quando os beijos dele me percorriam.”

-Ah! Ela quer me matar! –Ele ri, completamente enlouquecido.

 Volta outra vez a se inclinar sobre o diário, com as pernas cruzadas sobre a cama. Os olhos descem depressa com uma aflição por ler mais e mais.

 “As pernas dele nas minhas estavam se encaixando, nossos pés brincando um no outro... Fiquei sentindo cada pequeno movimento e palavra que me dizia.

-Eu amo você. –Ele apertou minha mão e repetiu. Quando percebi já estava em mim.

 Eu não sei explicar, penso que não há como. Só sei que é algo muito diferente de tudo no mundo. Uma invasão, um susto, um abraço mais forte, uma intimidade tão grande que muitas vezes parece posse...”

-Nossa... A Roberta devia ter me deixado ler isso antes... O pior é que nesse “regime militar” eu não posso ir lá e agarrar ela tão forte como eu tenho vontade... –Ele passa a mão pelo rosto que está quente.

 A febre está a tomar conta dele, uma vontade louca de voltar àquele dia e fazer os dois tudo o que fizeram, ainda mais gostoso do que está escrito.

 Diego continua lendo, não aguentando esperar. Os garotos não demorariam a entrar no quarto e talvez o pegassem ainda com o diário de Roberta em mãos, mas ele nem se lembra disso, os minutos vão se passando juntamente com as páginas e os delírios dele...

 Passando alguns metros dali, no quarto das meninas, Roberta conversa com Alice, que tenta convencê-la do grande erro que cometeu.

-Se eu fosse você nunca que eu iria mostrar o meu diário.

-É, mas você não sou eu! –Roberta senta na cama enquanto enxuga o cabelo molhado com uma toalha.

-Roberta, acorda! São os segredos femininos que prendem os homens!

-Claro que não!

-Claro que sim!

-Isso de prender homem é ridículo! –Roberta nem dá confiança. –Além do mais eu não preciso disso, eu sei que o Diego me quer.

-Mas eles gostam de ter o que descobrir em uma mulher. É instintivo! –Alice insiste, cruza as pernas sobre a cama e continua. –Você vai deixar tudo assim? Exposto pra ele?

-Vou.

-Você é louca! Confia demais... –O medo de Alice é claro.

-Eu confio sim...

-Mas?... –Alice percebe que ela quase hesita.

-Nada.

-Robeertaa!

-Ah! –Ela pausa sem saber se continua. -Eu fico tensa de imaginar o que ele tá pensando... Eu escrevi coisas muito... Você sabe...

-Pior que não sei...

-Eu fico imaginando o que ele tá achando da minha visão dos nossos momentos... É tão pessoal que chega a doer imaginar deixar isso com ele, mesmo confiando muito.

 Roberta não entende que ter os seus mais intensos sentimentos gravados em uma folha de papel e entregues nas mãos de alguém, mesmo que esse alguém seja tudo que mais se ama, é como se andássemos nus pela rua e todos pudessem nos ver.

 <<Cap 69        Cap 71>>